Triagem Neonatal no Brasil: atualizações para profissionais de saúde

Instituído no Brasil na década de 1990, o Teste do Pezinho é considerado a maior iniciativa do Sistema Único de Saúde (SUS) na área de pediatria e da genética, sendo uma importante política de prevenção à saúde e redução de sequelas causadas por doenças raras congênitas e elevada morbi-mortalidade infantil.

O exame tornou-se obrigatório no território nacional em 2001 e faz parte do Programa Nacional de Triagem Neonatal, uma estratégia de saúde pública adotada por inúmeros países e encorajada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), visando o rastreio de doenças em fase pré-sintomática que podem ter seu desfecho alterado a partir do diagnóstico e tratamento precoces.

Neste artigo, você irá se informar sobre a evolução do Teste do Pezinho ao longo dos anos e a situação atual do exame no Brasil, após a recente lei que ampliou a cobertura de doenças oferecidas pela rede pública de saúde. Também irá se atualizar sobre as tecnologias aplicadas no exame e seu impacto na trajetória das doenças raras.

Triagem Neonatal: uma breve história

A criação dos programas de Triagem Neonatal se deu graças a duas importantes descobertas científicas feitas acerca da doença metabólica hereditária Fenilcetonúria (PKU), causadora de importantes comprometimentos intelectuais em crianças. Na década de 1950, uma equipe médica do Reino Unido desenvolveu um tratamento com dieta modificada que, se introduzido antes de causar danos neurológicos, era capaz de mudar o curso natural da doença, permitindo que o indivíduo tivesse um desenvolvimento normal. 

Na década seguinte, outra equipe médica, dos Estados Unidos, desenvolveu um exame laboratorial capaz de detectar o nível desse aminoácido precocemente, a tempo de introduzir a recém-descoberta dieta de forma a impedir o avanço da PKU. O sucesso da estratégia permitiu que milhares de bebês fossem beneficiados com a intervenção precoce e, assim, tiveram início os programas de triagem massiva².

Como funciona Teste do Pezinho

A técnica aplicada pela equipe médica norte-americana era simples e eficaz: a partir de gotas de sangue coletadas por punctura do calcanhar do bebê e acondicionadas em papel filtro, era possível transportar a amostra de forma segura ao laboratório sem necessidade de refrigeração², método que continua sendo aplicado até hoje e que foi expandido para rastrear mais condições.

A partir do material, é possível investigar, além da Fenilcetonúria, outros erros inatos do metabolismo/doenças metabólicas hereditárias, bem como doenças hematológicas, endócrinas, imunológicas e outras desordens hereditárias. Os métodos de análise incluem eletroforese, aferição da atividade enzimática, imunoensaios, espectroscopia de massa em tandem e reação em cadeia da polimerase, além do revolucionário sequenciamento de nova geração, incorporado mais recentemente.

Para a eficácia do exame, é importante que o material seja coletado entre o 3º e o 5º dia de vida do bebê. O resultado oferece o valor de risco para a doença e, dependendo do protocolo, deve ser seguido pela repetição do exame ou pela realização de um teste confirmatório para a obtenção do diagnóstico³.

Diagnóstico em recém-nascidos: uma janela única de oportunidade

A grande relevância do Teste do Pezinho está na possibilidade de identificar doenças metabólicas hereditárias, doença falciforme, hipotireoidismo congênito, erros inatos da imunidade, dentre outras condições genéticas antes que elas se manifestem no organismo, ou que as sequelas comecem a se instalar. Dessa forma, é possível diminuir e até impedir complicações irreversíveis, possibilitar o desenvolvimento saudável da criança e ainda evitar a mortalidade.

O caso da Fenilcetonúria é bastante ilustrativo. Enquanto os quadros não tratados podem começar a gerar danos cerebrais logo na 3ª semana de vida e causar prejuízos cognitivos irreparáveis, a introdução do tratamento alimentar no início da vida pode propiciar o desenvolvimento normal da inteligência e funções neurológicas, além de boa capacidade de fala e leitura.

Outro exemplo é o cenário do Hipotireoidismo Congênito, que, por muito tempo, foi uma das principais causas de deficiência intelectual no Brasil e no mundo⁵. A doença, no entanto, apresenta poucas chances de problemas significativos a longo prazo se tratada a partir das primeiras semanas de vida.

Além disso, é possível citar a Atrofia Muscular Espinhal (AME), doença genética rara que afeta 1 a cada 10 mil nascidos e compromete os movimentos e a força muscular. Embora ainda não tenha cura, a AME é tratável — e quanto mais cedo for identificada, maiores são as chances de impedir a progressão da doença, possibilitando um desenvolvimento normal ou muito próximo dele. Recentemente, o Brasil deu um passo importante nesse cenário: o SUS passou a oferecer terapia gênica para crianças com AME, colocando o país entre os poucos no mundo com esse tipo de tratamento disponível na rede pública. Mas para que esse avanço chegue a tempo, o diagnóstico precisa ser precoce. É por isso que a triagem neonatal tem um papel tão decisivo nesse cenário. 

Além dos ganhos evidentes em saúde, o rastreio de doenças em recém-nascidos também oferece benefícios financeiros e emocionais em relação à jornada diagnóstica. Isso porque as doenças raras são marcadas por sintomas inespecíficos, frequentemente confundidos com doenças mais comuns e menos graves. Sendo assim, a busca pelo diagnóstico correto pode levar até 15 anos e ser altamente custosa à família, além de despertar frustração, medo e muitas dúvidas no processo, potencialmente submetendo o indivíduo a excessivos exames desnecessariamente.

Lei nº 14.154 e a evolução do Teste do Pezinho no Brasil

Os exames de triagem neonatal começaram a ser realizados em alguns estados brasileiros ainda na década de 1970, mas foram efetivamente incorporados ao Sistema Único de Saúde (SUS) a partir da Portaria GM/MS n.º 22, de 15 de janeiro de 1992, que dispunha sobre a avaliação para Fenilcetonúria e Hipotireoidismo Congênito em recém-nascidos.

Quase 10 anos depois, o programa foi reavaliado e aprimorado pelo Ministério da Saúde, que criou o Programa Nacional de Triagem Neonatal (PNTN) por meio da Portaria GM/MS n.º 822, de 6 de junho de 2001. Além de tornar o exame obrigatório em todo o território nacional, o texto ampliou o rol de doenças investigadas por ele, incluindo a Fibrose Cística, a Doença Falciforme e outras Hemoglobinopatias¹⁰. 

Outro objetivo importante da atualização na época foi ampliar a abordagem dada à questão, determinando não apenas a realização do teste, mas também a busca ativa dos casos suspeitos, a confirmação diagnóstica, a oferta de tratamento e o acompanhamento multidisciplinar dos pacientes, visando alcançar a meta principal do PNTN, que é a redução da morbimortalidade provocada pelas doenças rastreadas¹⁰, que são potencialmente tratáveis.

Mais recentemente, o programa recebeu outra atualização de extrema importância. Incorporando avanços da medicina genética ao sistema público, em 2021; o Governo Federal sancionou a Lei nº 14.154, que ampliou o rol de doenças rastreadas pelo Teste do Pezinho básico no SUS. Das 6 condições inicialmente triadas, o exame passa a cobrir 50, incluindo Atrofia Muscular Espinhal e Toxoplasmose Congênita.

A mudança representa a chance de uma vida mais saudável e um futuro com mais oportunidades para milhares de crianças e, para ser incorporada, vem sendo adotada pelos estados de maneira escalonada, em cinco etapas. 

A primeira, já concluída, contemplou as doenças que já estavam incluídas no PNTN: Fenilcetonúria e outras Hiperfenilalaninemias, Hipotireoidismo Congênito, Doença Falciforme e outras Hemoglobinopatias, Fibrose Cística, Hiperplasia Adrenal Congênita e Deficiência de Biotinidase⁹. Além disso, a etapa I inseriu, na Tabela SUS, o procedimento de detecção de Toxoplasmose Congênita, até então não rastreado pelo exame básico.

A segunda etapa prevê a incorporação do rastreio de mais condições genéticas: as Galactosemias, as Aminoacidopatias, os Distúrbios do Ciclo da Ureia e os Distúrbios da Beta Oxidação dos Ácidos Graxos. A terceira etapa irá abranger as Doenças Lisossômicas, enquanto que a quarta etapa irá incorporar as Imunodeficiências Primárias ou Erros Inatos da Imunidade. Por fim, a quinta e última etapa prevê a incorporação do rastreio de Atrofia Muscular Espinhal pelo Teste do Pezinho.

É válido ressaltar, no entanto, que profissionais de saúde têm se preocupado com a morosidade do processo em nível nacional⁹.

Já na rede privada, os avanços científicos têm sido incorporados mais rapidamente, permitindo que o Teste do Pezinho chegasse a um novo patamar. Graças ao advento de novas tecnologias de análise, hoje é possível multiplicar o número de condições triadas utilizando a mesma amostra de sangue em papel filtro, otimizando o exame e aumentando seu nível de eficácia.

O Nova Era, do DLE, é considerado a evolução do Teste do Pezinho por combinar as análises bioquímicas convencionais com tecnologias avançadas de análise bioquímica e genética, como a espectrometria de massas em tandem e o sequenciamento de nova geração. Assim, é possível rastrear mais de 400 condições com a mesma amostra, com menos resultados falso positivos, já que, quanto mais tipos de análises inseridas, maiores são as chances da associação precisa de dados encontrados.

O direito à saúde e ao desenvolvimento saudável das crianças deve ser uma prioridade de toda a sociedade, e, nesse ponto, os profissionais de saúde têm um papel fundamental. O acesso ao diagnóstico precoce e às melhores opções de cuidado começa com a conscientização e orientação das famílias. 

Conte com o DLE para manter-se atualizado sobre as doenças raras e triagem neonatal. Por aqui, oferecemos suporte técnico-científico para quem está na linha de frente do cuidado, com base em mais de 35 anos de experiência. 

Para saber mais sobre as opções de Teste do Pezinho oferecidas pelo Laboratório DLE, acesse o nosso site. Nele, você encontrará informações essenciais sobre os testes disponíveis, tecnologias utilizadas e como programar a coleta com antecedência. Além disso, você conta com um guia completo e gratuito sobre o Teste do Pezinho, ideal para compartilhar com as suas pacientes que aguardam a chegada do novo integrante da família. 

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Referências: 

  1. Triagem neonatal biológica brasileira: revisão integrativa. Revista de APS. Disponível em: https://periodicos.ufjf.br/index.php/aps/article/view/34474/24833 
  2. Junho: Um mês de júbilo para a Triagem Neonatal. Laboratório DLE. Disponível em: https://www.dle.com.br/wp-content/uploads/2023/06/Artigo_DrArmando_PKU_2023-06.pdf 
  3. Newborn Screening. National Library of Medicine. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK558983/ 
  4. O Teste do Pezinho pode ser realizado antes de 72h de vida do bebê? BVS Atenção Primária em Saúde. Disponível em: https://aps-repo.bvs.br/aps/o-teste-do-pezinho-pode-ser-realizado-antes-de-72h-de-vida-do-bebe-2/#:~:text=O%20teste%20do%20pezinho%20deve,nascimento(1%2D3)
  5. A Importância da Realização Precoce do Teste do Pezinho: O Papel do Enfermeiro na Orientação da Triagem Neonatal. ID Online Revista de Psicologia. Disponível em: https://idonline.emnuvens.com.br/id/article/view/742.
  6. Fenilcetonúria e suas variantes: revisão bibliográfica. Repositório Institucional da Fernando Pessoa. Disponível em: https://bdigital.ufp.pt/entities/publication/4b7410f5-133e-4056-888d-d7ec4b34b604 
  7. Hipotireoidismo em bebês e crianças. Manual MSD. Disponível em: https://www.msdmanuals.com/pt/casa/problemas-de-sa%C3%BAde-infantil/dist%C3%BArbios-hormonais-em-crian%C3%A7as/hipotireoidismo-em-beb%C3%AAs-e-crian%C3%A7as
  8. O que é a Lei nº 14.154 e como ela impacta a triagem neonatal. LinkedIn Laboratório DLE. Disponível em: https://www.linkedin.com/posts/laboratoriodle_sancionada-em-2021-a-lei-n%C2%BA-14154-ampliou-activity-7257807040402571265-A8xB/?utm_source=share&utm_medium=member_desktop.
  9. O diagnóstico de uma doença rara pode levar até 15 anos. Como mudar isso?. CBDL. Disponível em: https://cbdl.org.br/o-diagnostico-de-uma-doenca-rara-pode-levar-ate-15-anos-como-mudar-isso/ 
  10. Necessária regulação e implantação das fases da triagem neonatal. CONJUR. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2024-abr-10/necessaria-regulacao-e-implantacao-das-fases-da-triagem-neonatal-ampliada-para-o-atendimento-ao-direito-fundamental-a-saude/ 
  11. Manual de Normas Técnicas e Rotinas Operacionais do Programa Nacional de Triagem Neonatal. Ministério da Saúde. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/triagem_neonatal.pdf 
  12. Na primeira etapa da ampliação do Teste do Pezinho, Governo Federal incorpora exame para toxoplasmose. Governo Federal. Disponível em: https://www.gov.br/pt-br/noticias/saude-e-vigilancia-sanitaria/2022/06/na-primeira-etapa-da-ampliacao-do-teste-do-pezinho-governo-federal-incorpora-exame-para-toxoplasmose 
  13. LEI Nº 14.154, DE 26 DE MAIO DE 2021. Senado Federal. Disponível em: https://legis.senado.leg.br/norma/34012681/publicacao/34013642